Summary: | Comparar trajetórias políticas ao longo de um século supõe um esforço muito maior de esquecimento do que de memória. Tentarei aqui converter uma grande quantidade de matérias analíticas muito heterogêneas em algumas conjeturas "popperianas". Elas podem provir de qualquer parte e podem ser submetidas à corroboração ou à refutação. Ou seja, trata-se de um processo inverso à tarefa estritamente acadêmica. Em certamedida, estou recomeçando "desde o zero" o meu trabalho. É verdade que a história democrática argentina, no século XX, é mais longa do que a brasileira. Todavia, essa diferença não invalida a comparação. Minha hipótese concisa é a seguinte: na política democrática brasileira, a dimensão institucional é dominante - as instituições, de fato, representam o lugar em que se dão as interações e em que os atores coletivos configuram-se. Em compensação, nessas instituições, a inclusão tanto social como política tem sido fraca. No entanto, no caso argentino, a dimensão inclusiva tem sido dominante, com o prejuízo indubitável da dimensão institucional. Na política democrática argentina, participaram "todos". Na política democrática brasileira até 1964, a estabilidade baseou-se na exclusão - por exemplo, das massas rurais. Estas hipóteses podem estar corretas ou erradas, mas, em qualquer caso, importa dizer que não as estabeleci ex nihilo, como vindas do nada, nem diacrônica, nem sincronicamente. Diacronicamente, porque a história do século XX sustenta-se, é obvio, na do XIX; sincronicamente, porque com certeza cada uma das hipóteses ou conjeturas que discuti aqui pode imbricar-se com os processos do próprio século XX, com os dramas, as lutas, as lideranças, os conflitos, as controvérsias, as gestões de governo, os períodos de depressão e de prosperidade e as esperanças, tudo, enfim, o que constitui a história desse século.
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